domingo, 28 de agosto de 2011

FolhaLeaks: mais uma vez a diplomacia americana demonstra arrogância e incompetência


A reportagem da Folha de hoje divulgando documentos do Itamaraty que foram sigilosos é um belo serviço à inteligência. Ou melhor: é a melhor demonstração de que arrogância e burrice estão intrinsecamente ligadas, têm a mesma matriz. Os documentos, de mais de 10 mil páginas, foram produzidos pelo Itamaraty e embaixadas brasileiras no período de 1990 a 2001, correspondente aos dos governos de Collor, Itamar e FHC (pelo Brasil) e de Bush pai, Clinton e Bush filho (pelos Estados Unidos). São 261 mensagens confidenciais que trazem “acusações de espionagem, violação de correspondência e de bagagens de diplomatas, além de críticas à política norte-americana”. Mas acima de tudo documentam a arrogância da “diplomacia” dos nossos “irmãos” do Norte. Vejam alguns trechos da reportagem:
Entre 1992 e 1993, lacres metálicos foram rompidos e as autoridades alfandegárias norte-americanas em Miami tentaram submeter as malas diplomáticas brasileiras a análises de raio-x, incluindo uma remessa proveniente da embaixada em Havana.
Em novembro (de 1992), o consulado informou que o secretário Fernando Vidal, do correio diplomático de Havana, "foi retido por funcionário da alfândega norte-americana para averiguações" sobre a bagagem que trazia de Cuba em avião de carreira.
O tratamento dado a turistas brasileiros pelos EUA nos consulados e na imigração foi tido como "inadequado" e "degradante" pelo Brasil. O então chanceler Celso Amorim, definiu como "inadequado" o tratamento e "motivo de humilhação" os questionários para obtenção de visto. O embaixador norte-americano Melvin Levitsky na ocasião (1994) admitiu que problemas aconteciam porque os EUA desconfiavam do Brasil – segundo ele, país com grande número de portadores de documentos falsos, só atrás de México e El Salvador.
Em 2000, foi chamado de "degradante" o tratamento dado a diplomata brasileiro, algemado e detido em cela após dizer, em tom jocoso, que o embrulho que levava era uma bomba. Há relatos de brasileiros, com vistos, que foram barrados e presos.
Em março de 2001, a poucos dias de uma visita do presidente Fernando Henrique Cardoso ao colega recém-eleito George Bush, os telefones da Embaixada do Brasil em Washington (EUA) começaram a ter uma "sensível perda de qualidade" e ficaram "praticamente" mudos. O embaixador brasileiro à época, Rubens Antonio Barbosa, encomendou uma varredura nos telefones. Técnicos lhe disseram que problemas semelhantes vinham ocorrendo em outras embaixadas, sempre às vésperas de visitas de presidentes e autoridades dos países. A primeira checagem nos aparelhos não encontrou sinais de grampo. Mas, dois meses depois, uma nova inspeção confirmou as suspeitas do embaixador.
O embaixador contou, em recado para o então ministro das Relações Exteriores, Celso Lafer, que "descobriu-se o que pareceria ser uma ligação telefônica direta entre o prédio da Chancelaria [brasileira] e o Departamento de Defesa norte-americano". "A ligação opera à semelhança de um ramal interno, isto é, ao se discar o dígito '0' atende uma telefonista daquele órgão do governo dos EUA", relata Barbosa.
Há inúmeras “gracinhas” desse tipo. E a arrogância é tanta que o Presidente, em 1990, o ex-Presidente Jimmy Carter (Democrata!) pretendeu participar do comitê preparatório para realização da ECO-92, no Rio! E o Senador Edward Kennedy (também Democrata!) pressionou (1992) o Brasil para cumprimento ao embargo praticado contra o Haiti.
As barbaridades são infindáveis. E o pior é que foram feitas contra um país tido como um dos principais aliados dos governos norte-americanos. Pura burrice. Com toda certeza, bastariam relações minimamente civilizadas para que o Brasil da época colocasse a proximidade com os Estados Unidos como principal objetivo estratégico. Foi essa arrogância absurda que valorizou o trabalho do WikiLeaks. Afinal, nada melhor do que colocar o prepotente no seu devido lugar. Mas ainda existe uma curiosidade que me deixa intrigado: o ex-Chanceler do Governo Fernando Henrique, Celso Lafer, aquele que tirou o sapato diante dos funcionários da Alfândega americana, disse à Folha que, “passados quase 20 anos dos incidentes, não se recordava dos problemas em Miami”. Pode?
Link para os documentos aqui.